Suicídio lento

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Uma reflexão filosófica existencia, esse é um texto forte, escrito por Jonas Ribas, pensando as formas de ir se perdendo no caminho da vida, em suicídio lento.

por Jonas Ribas

As pessoas gostam de especular sobre várias coisas, entre elas, a vida e a morte. Assistem séries, falam dos que já se foram e tantas outras formas de tentar entender ou suprir a existência. No que diz respeito ao suicídio, a forma mais dolorosa que se estabelece enquanto consenso de morte lenta é o enforcamento.

Entretanto, existem tantas outras formas de suicídio lento, quase indetectáveis.

O sujeito trabalha cotidianamente debaixo do sol, edificando obras de espaço privado, que são muito mais bonitas pela sua forma constituinte que pela sua forma estética.

O trabalho árduo se desconta em goles suaves de aguardente, que pretende ser cura psiquica e da alma. Essas mesmas águas-ardentes, que mescladas a misticismos se expressam de várias formas, em especial como curadora de doenças, quando curtida em ervas por dias. A sorte é o cálculo entre cada mililitro e o tempo do feijão cozinhar.

Trabalhar sábado a noite é complicado, você pode espernear tal condição de várias maneiras, mesmo que em protestos discretos com caras feias. Mas ao ver uma pessoa que trabalha 20 km de sua casa, depois de limpar várias privadas o dia todo, você repensa a situação. Chegar em casa, apanhar do marido e depois, sem tantas esperanças, dar o dízimo ao pastor são coisas difíceis…

Agora pensemos as pessoas neurodivergentes, que além da corrida social, precisam disputar as questões cognitivas. Tais pessoas podem desenvolver várias potencialidades, entretanto, a norma é o padrão do que pode ser estabelecido. Ser alguém tolerado pela gerência por ser inofensivo não passa de um lamento pequeno-burguês, diante da comparação que quero fazer.

Várias pessoas com deficiência ficam reclusas ao espaço interno, pela inoperância de uma sociedade que é tão boa em produzir máquinas, mas fraca em manter seres humanos. Essas pessoas nem tem o prazer da tolerância velada de gerentes a serviço do mercado e da produção.

Presenciar de forma cotidiana todas essas coisas nos levam a dois rumos: mudar ou acomodar. Se propor a mudar é um meio de transformar a realidade, que se esvai no primeiro respiro de individualidade. Mudar é difícil, pra muitos impossível. Se acomodar e ser consciente de tal coisa é admitir que a existência não passa de um pragmatismo da matéria.

Resta então a lenta autodestruição do sujeito, entre vídeos curtos de TikTok e outros componentes de um “suicídio”, que progride lenta e dolorozamente, até que se consuma em um evento arterial em um dia qualquer de sol.

Aproveite para assistir à resenha do livro Sociedade do Cansaço

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