Do que vivi e vi, procurei usar (ainda que indiretamente) no roteiro do vídeo que fiz sobre MERITOCRACIA. Mantive a objetividade, sem falar de mim diretamente, mas nunca esquecendo das minhas próprias experiências.
Quando eu fiz o vídeo sobre MERITOCRACIA no canal, eu tentei ser o mais justo possível e pensar nas coisas que esperamos que aconteça para além da teoria. Não queria um vídeo muito “tendencioso”, ou seja, que desse uma resposta direcionada desde o início, sem pensar nos múltiplos pontos que mostrassem o que é o que diz ser, mas não é. Queria que fosse mostrada uma visão mais realista, com exemplos realistas.
Por isso, embora não tenha falado disso diretamente no vídeo, eu lembrei da minha infância e adolescência, de como eu era privado de muitas coisas pela posição que ocupava na sociedade e dos muitos sonhos que tinha e da dificuldade que tive para superar alguns obstáculos. Eu era um menino pobre, entre muitos do interior de São Paulo, nascido numa época em que a mortalidade infantil imperava no Brasil. Numa época em que a fome era uma realidade bem amarga.
Pode parecer apenas choradeira minha, mas não é esse o objetivo desse post. A ideia é pensar “em primeira mão”, as experiências próprias da minha vida e somá-las a exemplos outros, factuais, dos tantos que temos na sociedade que nos envolve.
Como eu dizia, lembrei do que vivi. Me lembrei de que sonhava em ser rico e dar uma mansão pra minha mãe… com o tempo, fui chegando a conclusões, a partir de estudos pessoais ou acadêmicos, sobre os limites que nos são impostos pela estrutura montada na sociedade. Uma estrutura que comporta um número reduzido de pessoas que tem muito; outros tantos que se situam como “classe média” (seja lá o que isso signifique) e outros como classes mais baixas, alguns com pouco, outros com quase nada; outros ainda – e são muitos – que estão abaixo da linha da pobreza, em situação miserável ou passando fome.
Hoje, depois de uma trajetória pessoal que teve altos e baixos, posso dizer que minha vida está bem melhor, mais confortável e estável. Mas, ainda está longe do que eu imaginava que seria se me esforçasse o bastante, se fosse dedicado. Se tirasse boas notas, se fosse um bom funcionário, se me dedicasse ao máximo no que fizesse… enfim, se eu MERECESSE.
Resumindo bastante, me aventurei a trabalhar com informática no Mato Grosso do Sul (centenas de quilômetros longe de casa), estado que só conhecia de nome e que me diziam era cheio de índios e onças. Depois de durezas que não vem ao caso aqui, decidi fazer vestibular para o curso de História em universidade pública: se passasse ficava no MS, se não, voltaria pra minha vida indiferente no interior de São Paulo. Passei. Mas só sobrevivi porque tive ajudas, assim como tive bolsa de iniciação científica. Ou seja, havia incentivo a permanência para um aluno que tinha pouca perspectiva para terminar os estudos, pois teria que escolher entre fazer um bom curso ou trabalhar. Sobrevivi. Depois resolvi fazer mestrado, crendo que isso tornaria o mercado de trabalho mais acessível e o salário melhor. Consegui terminar o mestrado, mas isso também porque contei com uma bolsa que me permitiu seguir firma até o fim. Da mesma forma, já morando em Santa Catarina, entrei no Doutorado em 2015. Eu já era concursado, mas seria impossível dar aulas e arcar com os custos, já que fui fazer doutorado na USP, em São Paulo. Mais uma vez fui agraciado com bolsa, ou seja, recebia uma quantia, longe de ser o ideal, mas que me permitiu terminar o doutorado em 2019.
Enfim, meu trajeto de estudos tem oficialmente 11,5 anos. O que na minha ideia de criança me tornaria rico e me permitiria dar uma vida melhor pra minha mãe e meu pai.
A ideia de ser “rico” logo se tornou uma irrealidade. Na verdade, ao longo do tempo isso foi mudando na minha cabeça. Hoje vejo isso como problemático, pois me parece que quer dizer que outros tantos precisam ser pobres, ou pior, precisam ser explorados e espoliados para que uns tenham bastante. Por isso, prefiro pensar que quero viver confortavelmente e espero que outros tantos também possam. Por isso, vejo o Brasil tão problemático e desigual, coisa que não é novidade. Desigual, conservador e reacionário, do tipo que tem elite ciosa de perder privilégios e que tem horror a palavra divisão (logo bradam: comunista!).
Um país onde 53% de brasileiros vivendo na pobreza extrema. Onde, segundo o Child Fund Brasil, “somos um país desigual, no qual muitos vivem com menos que um salário mínimo. Isso significa que um número enorme de brasileiros têm uma renda que representa menos de 1/3 do preço da cesta básica (definida pelo Dieese) para o estado de São Paulo, por exemplo”.
Mas como eu dizia: do que vivi e vi, procurei usar (ainda que indiretamente) no roteiro do vídeo. Mantendo, claro, a objetividade, sem falar de mim diretamente, mas nunca me esquecendo do que vi; que me lembra hoje que meritocracia é uma irrealidade, para dizer de forma mais polida. O conceito é lindo, mas por muitos motivos, não funciona já na partida e é justamente isso que procurei mostrar no vídeo abaixo.
Se ainda não assistiu, vai lá!
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