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Sergio Buarque está entre aqueles historiadores brasileiros que mais ganharam notoriedade no século XX, pelo seu talento e pela riqueza da sua obra. Nessa ele tratou de temas que incluem, entre outros, a história de São Paulo, as monções, os caminhos, as fronteiras e as raízes do Brasil!


Sergio Buarque de Holanda é paulistano (da capital), nascido em 11 de julho de 1902, e também em São Paulo morreu em 24 de abril de 1982. Mas, apesar de suas “raízes” ele não esteve o tempo todo fixo na capital paulista, tendo morado no Rio de Janeiro e transitado pelo exterior, na maior parte do tempo como professor e pesquisador. 


Ele estudou nas tradicionais Escola Caetano de Campos e no Ginásio São Bento (hoje Colégio São Bento), em São Paulo, onde foi aluno do famoso Afonso Taunay. Ao 19 anos foi morar no Rio de Janeiro, onde participou de um dos momentos culturais brasileiros mais transformadores do século, a Semana de Arte Moderna, atuando inclusive como representante da revista Klaxson, com nomeação feita por Mário de Andrade e Oswald de Andrade. 




Talentoso e dedicado como poucos escritores e intelectuais brasileiros, ele construiria sua carreira entre a História e a Sociologia, num diálogo que permearia toda sua obra. Antes disso, ele atuou no jornalismo, tendo ao longo de sua formação uma forte influência da literatura, sobretudo na sua escrita, ou o que alguns diriam, ele tinha uma bela “estética” em seus textos. Sua formação acadêmica inicial se daria pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil – que hoje é a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) -, onde obteve o título de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais no ano de 1925.


Sua atuação profissional nos primeiros tempos foi como jornalista. Depois de sua experiência na Klaxson, trabalhou no carioca Jornal do Brasil. Através do mesmo jornal foi correspondente em Berlim, Alemanha, entre os anos 1929-1931. Mesmo depois de voltar ao Brasil nos anos que se seguiram na década de 1930, ele continuou atuando no jornal impresso. 


Só em 1936 as coisas começariam a tomar um rumo diferente, quando ele obteve o cargo de professor assistente da Universidade do Distrito Federal (a parte que viria a compor a Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, atual UFRJ). A mesma Universidade seria extinta em 1939, tendo Sergio Buarque começado a trabalhar como burocrata federal, o que duraria por muito tempo.


Ainda no mesmo ano publicou o seu livro mais famoso, Raízes do Brasil. De influência weberiana, ele trata da questão da colonização brasileira, seus resultados e suas consequências. Está inserido num conjuntos de estudos de vários autores mais ou menos contemporâneos que buscaram recuperar as origens e os aspectos fundadores do nosso país. Nesse livro se analisa questões referentes ao “patrimonialismo” e ao chamado “cordialismo” ou do “homem cordial”, coisa, aliás, que gerou confusões desde 1936. Segundo Pedro Monteiro, trata-se de uma idealização de Sergio Buarque, a partir de uma certa genealogia, onde ele busca um sujeito “que ao mesmo tempo é capaz de reinstaurar o afeto, o amor, relações que a princípio a gente atribui à família; busca reinstaurar isso no âmbito da política e no âmbito das relações públicas”. Assim, no livro “busca-se a relação do indivíduo com o Estado, a relação do indivíduo com o pacto político, as pulsões, os desejos…” (Pedro Monteiro).


Interessante de se dizer que o livro Raízes do Brasil passou por transformações nas suas várias edições ao longo dos anos, o que levou em conta a trajetória do autor e suas mudanças de pensamento. Isso foi tema especial para um trabalho recente de Lilia Moritz Shwarcs e Pedro Monteiro, que traz uma verdadeira arqueologia da produção do livro e que recebeu o título de Raízes do Brasil: Edição Crítica.




Em 1941, Sérgio Buarque passou a atuar como professor visitante em várias universidades dos Estados Unidos. Essa experiência, pelos contatos que teve, influenciariam fortemente nos seus escritos seguintes e ajudaram moldar ainda mais suas compreensões sobre a história e a sociedade. 


Suas publicações foram então se acumulando, tendo reunido em 1944 no volume intitulado Cobra de Vidro uma série de artigos e ensaios que antes tinha publicado na imprensa. Nos doze anos seguintes publicaria os fascinantes livros Monções (1945) e Caminhos e Fronteiras (1957), que consistem em coletâneas de textos sobre a expansão oeste da colonização da América Portuguesa entre os séculos XVII e XVIII. Mas não só isso, com linguagem fácil e acessível, eles fazem os leitores viajarem junto com o autor, imaginarem experiências e contatos, quase sentirem as venturas e desventuras daquele período, do contato dos “brancos” com os índios, das trocas entre eles, dos aprendizados, das riquezas e desgraças, de viagens, aventuras, conflitos e mortes no “sertão”. 


Entre essas duas publicações, em 1946, ele voltaria a morar em São Paulo, onde assumiu a direção do Museu Paulista, ficando nessa posição até 1956. Seu sucessor seria nada mais nada menos que o seu antigo e famoso professor escolar, Afonso Taunay. Em 1948, começou a dar aulas na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, na cátedra de História Econômica do Brasil, em substituição ao industrial e economista Roberto Simonsen, que havia falecido em maio do mesmo ano.




Entre os anos 1953 e 1955, morou na Itália, a cargo da cátedra de Estudos Brasileiros da Universidade de Roma. Ao voltar ao Brasil, em 1958, assumiu a cadeira de História da Civilização Brasileira, agora na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP). Para prestar o concurso para esta vaga, ele escreveu então aquele que – segundo ele próprio – seria seu melhor livro: Visão do Paraíso. A publicação do mesmo se daria no ano seguinte. 


Um livro bastante complicado, denso, que analisa os aspectos do imaginário europeu à época da conquista do continente americano. Visão do Paraíso mostra toda erudição de seu autor, onde procura entender “como espanhóis e portugueses reagiram e tentaram buscar o mito do Paraíso na terra. Uma crença que vem desde a Idade Média e que vai ter uma repercussão enorme quando ibéricos se defrontarem com a exuberância da natureza dos trópicos” (Saulo Goulart). Nesse processo, Sergio Buarque traça um comparativo entre a imaginação espanhola e a portuguesa, procurando mostrar como esses últimos eram menos criativos que os espanhóis. Isso demonstraria uma maior racionalidade dos portugueses, ainda que não no sentido “moderno” do termo, mas sim retoma essa racionalidade de autores como Santo Agostinho e Santo Isidoro, por exemplo. Teríamos então, com Sergio Buarque antecipando os franceses, a análise das mentalidades em torno do processo de colonização, com os elementos fantásticos espanhóis de um lado e o pragmatismo português de outro.


 visão do paraíso sérgio buarque



Ainda em 1958, ele ingressou na Academia Paulista de Letras e recebeu o Prêmio Edgar Cavalheiro, do Instituto Nacional do Livro, por seu livro Caminhos e Fronteiras


Suas ações passam a se multiplicar, assim como novos textos e livros vão se somando aos mais antigos que, por sua vezes, ganham renovadas edições, contribuindo assim para a compreensão da história brasileira. 


A partir de 1960, Sérgio Buarque tornou-se coordenador do projeto da História Geral da Civilização Brasileira, contribuindo ali também com uma série de artigos. Dois anos depois 1962, assumiria a presidência do recém-fundado Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Sem parar a vida de professor, entre 1963 e 1967, ele novamente atuou como convidado em universidades no exterior, tendo passado pelo Chile e novamente pelos Estados Unidos. Atuaria ainda em missões culturais da Unesco na Costa Rica e Peru. 


Em 1969, em plena Ditadura Militar brasileira, num protesto corajoso contra a aposentadoria compulsória (ou melhor, forçada, imposta) de colegas da Universidade de São Paulo, ele decidiu encerrar a sua carreira docente.



A produção, no entanto, continuou. Ele dirigiu a obra História Geral da Civilização Brasileira, dividida em volumes, que trata sobre literatura historiográfica brasileira. No âmbito da mesma, ele publicou, em 1972, Do Império à República, texto que, a princípio, era para ser apenas um artigo para a coletânea, mas que acabou se tornando um volume independente. Centrado na história política, nele Sérgio Buarque aborda a crise do Império brasileiro no final do século XIX, procurando explicar a mesma como um resultado da corrosão do mecanismo fundamental de sustentação deste regime: o poder pessoal do Imperador Dom Pedro II.


É interessante notar nesse ponto do nosso perfil sobre Sérgio Buarque de Holanda que ele foi a vida toda muito ativo e mesmo não tendo conseguido produzir outro texto comparável com Visão do Paraíso ou mesmo com os demais que o antecederam, ele seguiu escrevendo de forma muito importante até o ano de sua morte, em 1982 –  na verdade, segundo relatos de sua família, até os últimos dias ele sentava em seu escritório em busca de ideias e leituras. 


Mas, até 1982 ainda sairiam outros livros e artigos: por exemplo, em 1975 saiu o volume Vale do Paraíba – Velhas Fazendas e em 1979, saiu a coletânea Tentativas de Mitologia. No fim, ele procurou ainda reelaborar o livro Do Império à República, mas não conseguiu concluir o trabalho.



Ainda no fim de sua vida, ele seria premiado: em 1979, com o Prêmio Juca Pato, da União Brasileira de Escritores, e em 1980 também com o Prêmio Jabuti de Literatura, da Câmara Brasileira do Livro. 

Vale também mencionar que em 1980, com esperanças de novos tempos para a política e sociedade brasileira (que ainda vivia a Ditadura Militar), ele participou da fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), recebendo a terceira carteira de filiação do partido. 

Por fim, como se fosse necessário resumir seu perfil, recorremos a Antonio Candido, segundo o qual Sergio Buarque de Holanda era uma pessoa fascinante, “uma espécie de conjunto muito complexo, que uma coisa negava a outra. Ele era, por exemplo, um erudito extraordinário e muito inclinado à molecagem. Ele era um camarada de uma seriedade intelectual fora do comum e um gozador de marca maior”



Agora, caso queira saber mais sobre esse autor, existe, entre outros, o livro de Bernardo Ricupero, Sete Lições Sobre as Interpretações do Brasil. Outro tratando especificamente sobre o conceito de “homem cordial” seria Sérgio Buarque de Holanda e a Dialética da Cordialidade, de Paulo Niccoli Ramirez, e Contra a Cordialidade, de Felipe Beltran Katz. Sobre o aspecto imaginativo em relação ao Brasil teríamos Signo e Desterro, de Pedro Meira Monteiro. Há, enfim, o livro Pensadores que Inventaram o Brasil, de Fernando Henrique Cardoso.


Ah, já ia quase esquecendo. Sobre Sérgio Buarque existe também um interessante documentário, com dois episódios, de 2004, intitulado “coincidentemente” como Raízes do Brasil. Dirigido por Nelson Pereira dos Santos, ele conta a trajetória do autor, a partir de depoimentos de familiares e amigos.


Os livros desse autor:


Monções (1945)

Expansão paulista em fins do século XVI e princípio do século XVII (1948)




Do Império à República (1972, (História geral da civilização brasileira, tomo II, vol. 5)


O Extremo Oeste (obra póstuma, 1986)
Capítulos de Literatura Colonial (org. Antonio Candido)

O Espírito e a Letra (org. Antonio Arnoni do Prado, 2 vols, 1996)


Para Uma Nova História (org. Marcos Costa, 2004 – coletânea de textos publicados, quase todos, em jornais de notícias)

Escritos Coligidos – 1920-1979 (org. Marcos Costa, 2 vols, 2011)

Livro destaque desse autor:
 livro raizes do brasil
Raízes do Brasil
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* Essa postagem é só um guia rápido desse historiador. Se você souber de alguma incorreção ou tiver algum acréscimo de conteúdo a essa postagem, mande-nos nos comentários. Muito obrigado!

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* originalmente postado em 21/mar./2020.

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