por Eudes Fernando Leite*
& Frederico Augusto G. Fernandes**
Foi na noite de sábado,
dia 09 de novembro, no ILA, Corumbá-MS. Lá estiveram eles: a turma do siriri-cururu. Liderados
pelo inconfundível senhor Agripino Soares de Magalhães, uma espécie de mestre
do siriri-cururu em Corumbá. Os brincantes Inacinho, Vitalino, Nhôca e Martinho
exibiram sua alegria, cantaram toadas e brincaram.
Brincaram ao som de suas
violas-de-cocho, do ganzá e do tambor (mocho). O motivo da brincadeira foi o
lançamento do CD “Cururu do Pantanal Sul-matogrossense”. Juntaram-se a eles
diversas crianças que dançaram/brincando o siriri com os brincantes curureiros,
cuja idade parece variar entre os sessenta e oitenta e quatro anos de vivência.
O mestre-brincante recorreu à sua memória para dizer-se alguém não nascido em
Corumbá, embora se sinta um corumbaense. Reclamou do descaso dos políticos para
com a cidade, recordou o tempo áureo e como muitos outros discorreu sobre a
crise e a decadência da cidade que adotou para criar muitos de seus versos.
dia 09 de novembro, no ILA, Corumbá-MS. Lá estiveram eles: a turma do siriri-cururu. Liderados
pelo inconfundível senhor Agripino Soares de Magalhães, uma espécie de mestre
do siriri-cururu em Corumbá. Os brincantes Inacinho, Vitalino, Nhôca e Martinho
exibiram sua alegria, cantaram toadas e brincaram.
Brincaram ao som de suas
violas-de-cocho, do ganzá e do tambor (mocho). O motivo da brincadeira foi o
lançamento do CD “Cururu do Pantanal Sul-matogrossense”. Juntaram-se a eles
diversas crianças que dançaram/brincando o siriri com os brincantes curureiros,
cuja idade parece variar entre os sessenta e oitenta e quatro anos de vivência.
O mestre-brincante recorreu à sua memória para dizer-se alguém não nascido em
Corumbá, embora se sinta um corumbaense. Reclamou do descaso dos políticos para
com a cidade, recordou o tempo áureo e como muitos outros discorreu sobre a
crise e a decadência da cidade que adotou para criar muitos de seus versos.
Mas seu Agripino e seus
companheiros, na verdade, representam um dos mais significativos componentes da
cultura popular de Mato Grosso, do sul ou não, pouco importa. Representam os
elos da região com o passado colonial e, segundo parece, com a medievalidade
europeia. O cururu-siriri de Corumbá, de Cáceres, de Poconé e de várias outras
cidades mato-grossenses remanescem de trovas medievais, as ganharam novos
sentidos no interior da cultura popular da América Portuguesa; simplificaram-se
os alaúdes, canções e melodias. Novos significados brotaram, outros usos e
sentidos da música e da festa apareceram. O cururueiro tornou-se o arauto da
comunidade pantaneira. Seus versos trouxeram para as terras encharcadas de
Corumbá o lúdico e, desse modo, tornaram-se também expressão das crenças, dos
valores morais e fazem repercutir a denúncia social. “Marrequinho da lagoa/
Tuiuiú do Pantanal/ Marrequinho pega o peixe/ Tuiuiú já vem robá”, são versos
(ou “trovos” como chamam os cururueiros) que refletem bem mais do que uma observação
da natureza. Eles, explicou-se certa vez seu Agripino, dizem respeito à exploração
do latifundiário sobre o pequeno roceiro, que trabalha a terra abandonada
beira-rio e a perde, depois de cultivada, para seu proprietário legal. Sob
outra perspectiva, os versos demonstram que adjetivo identitário “pantaneiro” não
se restringe apenas ao fazendeiro ou ao peão e que há diferenças culturais e de
representações muito acentuadas entre as pessoas que convivem neste meio.
Melhor seria falar em “identidades” pantaneiras…
companheiros, na verdade, representam um dos mais significativos componentes da
cultura popular de Mato Grosso, do sul ou não, pouco importa. Representam os
elos da região com o passado colonial e, segundo parece, com a medievalidade
europeia. O cururu-siriri de Corumbá, de Cáceres, de Poconé e de várias outras
cidades mato-grossenses remanescem de trovas medievais, as ganharam novos
sentidos no interior da cultura popular da América Portuguesa; simplificaram-se
os alaúdes, canções e melodias. Novos significados brotaram, outros usos e
sentidos da música e da festa apareceram. O cururueiro tornou-se o arauto da
comunidade pantaneira. Seus versos trouxeram para as terras encharcadas de
Corumbá o lúdico e, desse modo, tornaram-se também expressão das crenças, dos
valores morais e fazem repercutir a denúncia social. “Marrequinho da lagoa/
Tuiuiú do Pantanal/ Marrequinho pega o peixe/ Tuiuiú já vem robá”, são versos
(ou “trovos” como chamam os cururueiros) que refletem bem mais do que uma observação
da natureza. Eles, explicou-se certa vez seu Agripino, dizem respeito à exploração
do latifundiário sobre o pequeno roceiro, que trabalha a terra abandonada
beira-rio e a perde, depois de cultivada, para seu proprietário legal. Sob
outra perspectiva, os versos demonstram que adjetivo identitário “pantaneiro” não
se restringe apenas ao fazendeiro ou ao peão e que há diferenças culturais e de
representações muito acentuadas entre as pessoas que convivem neste meio.
Melhor seria falar em “identidades” pantaneiras…
E o que se vê atualmente é
o aumento das preocupações com a identidade sul-mato-grossense e, nesse
ambiente, quase tudo é válido. De fato, o siriri-cururu é um dos componentes de
uma dessas identidades. O Mato Grosso e sua cultura, tal como o Brasil, resulta
de uma variada mistura étnico-cultural e é impossível – na verdade é perda de
tempo – buscar origens ou raízes. Elas não existem, pois toda cultura, em
qualquer momento está em permanente mutação. Valores, crenças, hábitos não foram
e não são estáticos, modificam-se de acordo com a época e o sentido que a
sociedade atribui a eles.
o aumento das preocupações com a identidade sul-mato-grossense e, nesse
ambiente, quase tudo é válido. De fato, o siriri-cururu é um dos componentes de
uma dessas identidades. O Mato Grosso e sua cultura, tal como o Brasil, resulta
de uma variada mistura étnico-cultural e é impossível – na verdade é perda de
tempo – buscar origens ou raízes. Elas não existem, pois toda cultura, em
qualquer momento está em permanente mutação. Valores, crenças, hábitos não foram
e não são estáticos, modificam-se de acordo com a época e o sentido que a
sociedade atribui a eles.
LANÇAMENTO!
* Realizou estágio de pós-Doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é professor de História na
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
* Pós-Doutor pela Brock University – Canadá. é professor associado do Departamento de Letras da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Letras na mesma Instituição.
** Imagem do topo: Cururueiro. Foto de Paulo Kyd
** Imagem do topo: Cururueiro. Foto de Paulo Kyd
Texto originalmente
publicado no jornal Gazeta Corumbaense, num domingo, 13 de julho de 2003.
publicado no jornal Gazeta Corumbaense, num domingo, 13 de julho de 2003.
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